Siga-nos nas Redes Sociais

Outras

Ausência de mulheres negras é desafio para ciência

Publicado

em

© krakenimages.com/Freepik

Imagine um mundo com mais mulheres cientistas. Para a Organização das Nações Unidas (ONU), isso é fundamental para alcançar a igualdade de gênero e o empoderamento de mulheres e meninas. É também uma forma de promover acesso igualitário das mulheres ao emprego pleno e ao trabalho decente. Além disso, é necessário para que o mundo consiga cumprir suas metas para o desenvolvimento sustentável, garantindo que as mulheres tenham participação plena e efetiva nas políticas, programas e processos de tomada de decisão.

Por essas razões, em 2015, a Assembleia Geral da ONU instituiu o dia 11 de fevereiro como Dia Internacional das Mulheres e Meninas na Ciência, convidando seus países membros a promoverem atividades que estimulem essa participação e busquem eliminar a discriminação.

Mas em países como o Brasil, combater apenas a desigualdade de gênero pode não ser o suficiente. De acordo com pesquisa do Grupo de Estudos Multidisciplinares da Ação Afirmativa da Universidade do Estado do Rio de Janeiro – Gemaa/UERJ, em 2023, as mulheres pretas, pardas e indígenas eram apenas 2,5% do número de professores em programas de pós-graduação nas áreas de ciências exatas, da terra e biológicas. Já as mulheres brancas somavam 29,2%, ainda bem abaixo do grupo majoritário, de quase 61%, composto por homens brancos.

“Tem um fenômeno que é compartilhado por quase todas as áreas do conhecimento. Quando você vai observando posições mais importantes na carreira acadêmica, a presença de mulheres vai decaindo. A gente fez essa pesquisa voltada para as áreas de exatas e viu que são áreas que têm desigualdades severas de gênero, e mais ainda, de raça. Então, se a gente pensa, ‘caramba! não têm mulheres nas ciências duras, nas ciências exatas’, a situação é ainda pior na questão racial e principalmente para as mulheres negras”, avalia a pesquisadora do Gemaa Márcia Cândido.

Representatividade

A professora da Universidade Federal do Espírito Santo Márcia Pereira conhece bem essa realidade. Ela é a única mulher negra no quadro de docentes do Centro Tecnológico da UFES, composto por sete cursos de graduação e seis de pós-graduação nas áreas de engenharia e informática. E não é uma experiência inédita na sua vida. Na sua turma inicial da graduação em Física, na década de 90, dentre 50 alunos, haviam apenas duas mulheres, e Márcia era a única mulher negra. 

“Quando eu passei no concurso da universidade, eu passei para o campus de São Mateus e atuei lá durante 10 anos. Mesmo São Mateus sendo a cidade com maior número de pessoas negras do Espírito Santo, eu era a única professora negra do campus inteiro”, lembra a professora.

A paixão de Márcia pela ciência começou na infância. “Sempre fui uma criança nerd. A minha mãe fala que eu só podia ser física mesmo, porque eu queria as explicações científicas das coisas. Eu brincava de laboratório e eu achava que eu ia fazer química, mas eu fiz uma visita ao observatório astronômico e fiquei apaixonada pela astronomia. E aí eu falei não, não é química que eu tenho que fazer! Eu tenho que fazer física”.

Ela realizou o sonho de trabalhar com astronomia, mas acabou enveredando por pesquisas sobre a história e o ensino da física, área em que fez doutorado, e hoje faz pós-doutorado. Márcia também se dedica a atividades educativas para a comunidade universitária e para o público em geral.

“Eu acho que a minha presença é uma coisa importante principalmente para as futuras gerações. Eu sempre fiz questão de dar palestras nas escolas, fazer cursos para crianças que faziam as provas da Olimpíada Brasileira de Astronomia, participar da Semana de Engenharia da universidade. Porque quando essas crianças me veem, elas veem a possibilidade de entrar na universidade. Elas veem uma pessoa negra num lugar que não é de submissão”, diz a professora da UFES.

Cotas

Márcia também destaca a política de cotas raciais como essencial para mudar esse estereótipo branco e pouco acessível do ensino superior brasileiro. “A gente vê uma universidade muito mais preta, muito mais cara de Brasil”, ressalta. 

E entre os milhares de estudantes que levaram mais diversidade para os espaços de ensino nos últimos anos está Daphny Santos, de 19 anos de idade, aluna da primeira turma de bacharelado em Matemática da Tecnologia e Inovação do ImpaTech, a faculdade do Instituto de Matemática Pura e Aplicada (Impa), inaugurada no ano passado.

“Eu gosto muito de matemática, e eu sei que, com certeza, tem muitas outras meninas por aí que se interessam. A minha mãe é professora de geografia de escola pública, e muitas mulheres da minha família têm estudo. Seja você mulher ou homem, se você quiser alguma coisa, você pode conseguir. Todo mundo é capaz e pode agregar em qualquer área”, defende Daphny.

O interesse pelos números começou quando ela participou da sua primeira Olimpíada Brasileira de Matemática. “Eu percebi que era divertido. Porque a gente só encontra diversão nos desafios, né? Se você está totalmente na sua zona de conforto, você não vai aprender nada de novo e nem vai se divertir”, diz.

E também foi essa atração pelos desafios que fez a jovem de Itapevi, em São Paulo, se mudar para a cidade do Rio de Janeiro, para se dedicar integralmente aos estudos, com aulas que vão das 8h até as 18h, além de atividades extraclasse. 

“Eu senti que eu tinha que fazer mais com matemática, entender melhor. Está sendo uma experiência bem desafiadora, mais do que eu pensava. Eu estou aprendendo muita coisa, e também a ter mais resiliência. Eu acho que essa é uma das qualidades que você mais precisa ter aqui, para você continuar o curso”, diz.

O Impatech tem um sistema de seleção próprio, mas 50% das vagas são reservadas para alunos de escola pública, como Daphny, e dentro desse recorte, 25 vagas são destinadas a pessoas pretas, pardas, indígenas, quilombolas ou com deficiência. Há também uma cota feminina, para garantir que pelo menos 25 alunos sejam mulheres. Essa turma mais diversa ajudou Daphny a se sentir mais acolhida.

“Tem muitas pessoas com quem eu consigo me identificar. E eu acho que isso  me deu força para não pensar que eu estava fora de uma bolha, que eu sou totalmente diferente de todo mundo e não vou ser capaz. Tem pessoas assim como eu que vieram de escola pública e também estão tendo que batalhar para poder continuar aqui. Isso dá força pra gente”.

Diversidade

Já a médica e pesquisadora Monique França foi beneficiária do sistema de cotas em 2010, quando entrou na graduação na Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), instituição pioneira na reserva de vagas, 12 anos antes da aprovação da Lei de Cotas. Era também uma época de muito preconceito contra os cotistas e até a mãe de Monique acreditava que a reserva de vagas era uma forma menos válida de acesso à universidade.

De forma explícita, Monique diz que a educação “mudou sua vida”, mas nas suas palavras também é possível perceber como a presença de mulheres como ela pode mudar a educação e a pesquisa no Brasil. 

“Você entrar na universidade, tendo alguma consciência ou a possibilidade de moldar a sua consciência racial e social, você pode cobrar mudanças de estrutura, de currículo, de abordagem. Falar de doenças que são negligenciadas, falar que o racismo pode adoecer”, defende Monique.

Atualmente, ela faz doutorado em Saúde Pública na Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), onde pesquisa a saúde da população negra. Ela acredita que a presença de mulheres negras nesses espaços ajuda a apontar lacunas que acabaram sendo normalizadas.

“Eu faço parte de um grupo de médicas negras pesquisadoras, e a gente está sempre ali no muro das lamentações, ‘o artigo foi recusado e a justificativa é que não tem relevância, que não tem nexo causal’ e etc. E aí no doutorado, o professor estava falando sobre os principais motivos de recusa de artigos e eu falei ‘o racismo deveria entrar no seu slide como motivo de recusa’. Porque você tem que se adequar e escolher um padrão que muitas vezes não abarca pessoas negras ou uma escrita negra, no conteúdo que se deseja publicar e estudar”.

A médica e pesquisadora também bateu de frente com uma das grandes barreiras impostas a mulheres pesquisadoras. Ela teve sua primeira filha dias antes de começar o mestrado, e engravidou da segunda logo depois de se qualificar. Com a ajuda de uma boa rede de apoio, conseguiu concluir os estudos dentro do prazo. Monique rechaça a ideia de que a maternidade “atrasa” a carreira das mulheres pesquisadoras, e diz que o problema está no preconceito contra mães na academia e na falta de apoio institucional.

“Me perguntaram na entrevista como eu faria o mestrado se eu estava grávida. E acho que ninguém pergunta para os homens se as companheiras deles estão grávidas numa entrevista de mestrado, né? É muito injusto pensar que você ter uma criança te coloca num lugar de diminuição da capacidade intelectual. Muito pelo contrário, você tem que ter muita intelectualidade para criar uma criança de forma respeitosa”, afirma. 

“Como você quer uma resolução de problemas de modo criativo se você só tem o mesmo perfil de pessoas debatendo? Então, mulheres, mães e pessoas negras são pessoas que podem ter uma potencialidade de diversidade para esse cenário de estudo, pesquisa e trabalho que se faz necessária para solucionar muitos problemas que a gente ainda tem no nosso país e no mundo”, defende.

A pesquisadora do Gemaa Márcia Cândido faz coro com Monique. “Diversas pesquisas no Brasil e também internacionais têm mostrado que quando você coloca diferentes experiências e perspectivas de vida convivendo num espaço social, você dá condições para que novas ideias surjam. Comprovadamente mostram essa eficiência da diversidade para trazer maior riqueza do ponto de vista intelectual e do ponto de vista de inovação de pesquisa científica, o que traz progresso para todo mundo.”

Concursos

Mas ainda é preciso vencer o gargalo da docência. “Como a gente tem a universidade pública muito vinculada à produção científica, acaba que esses homens brancos também estão dominando a produção científica feita no Brasil hoje”, argumenta a pesquisadora.

Os concursos para docentes nas universidades públicas federais também estão sujeitos à lei das cotas no serviço público e precisam reservar 20% das vagas para pessoas negras. Mas, muitas vezes, as vagas são oferecidas de forma fracionada, por departamento, áreas de conhecimento ou localidade, o que impede a aplicação da lei, já que é preciso ao menos três vagas para que uma seja reservada.

Um estudo feito no ano passado pela Universidade Federal do Vale do São Francisco e pelo Insper calculou que cerca de 10 mil pessoas negras poderiam ter sido contratadas como professores efetivos ou temporários, de junho de 2014, quando a lei entrou em vigor, até dezembro de 2022, se não fosse por esse fracionamento.

No ano passado, o Congresso Nacional aprovou uma atualização da lei de cotas no serviço público, que aumenta a reserva de vagas para 30%, inclui indígenas e quilombolas e diminui para dois o mínimo exigido para aplicação da cota. O projeto está em tramitação no Senado, que vai avaliar mudanças feitas durante a votação na Câmara e depois segue para sanção presidencial.

Enquanto isso, a professora da Ufes Márcia Pereira diz que os docentes têm discutido mudanças, como a publicação de editais únicos, para seleção de professores de diversas áreas do conhecimento, o que aumentaria a quantidade total de vagas e permitiria a aplicação da lei. Outra possibilidade levantada pela pesquisadora do Gemaa Márcia Cândido é que os departamentos façam seleções direcionadas, com vagas exclusivas para públicos específicos.

Fonte

A ImprensaBr é um portal de notícias que fornece cobertura completa dos principais acontecimentos do Brasil e do mundo.

Clique para comentar

Deixe uma resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Outras

Papa Leão XIV deve seguir pontificado de paz e acolhimento, diz CNBB

Publicado

em

© Reuters/Guglielmo Mangiapane/Proibida reprodução

O secretário-geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Dom Ricardo Hoepers, disse nesta quinta-feira (8) que a mensagem expressa pelo novo papa Leão XIV, ao ser escolhido como sucessor de Pedro, aponta para um pontificado voltado para o bem comum dos povos, em acordo com a doutrina social da igreja elaborada pelo papa Leão XIII, que serviu de inspiração para o nome do novo papa.

“Ele veio mostrar que é preciso que o mundo inteiro ore pela paz. Com esse início do pontificado dele, apontando para que a paz esteja entre as pessoas; para retomar a doutrina social da igreja, que tem como objetivo fundamental o diálogo entre as nações e o bem comum. Ele trouxe já de maneira muito positiva algo que todos nós ansiamos que é a paz no mundo”, afirmou o religioso, em coletiva de imprensa. 

Dom Ricardo também apontou a dignidade do trabalho e o combate à escravidão como possíveis temas que o novo papa deve abordar.

“Tenho certeza que o fato de resgatar Leão XIII e a doutrina social vai trazer mais intensidade para que o mundo se abra para a dignidade do ser humano no trabalho, principalmente combatendo a escravidão no trabalho, que muitos países ainda vivem isso”, avaliou. 

>> Siga o canal da Agência Brasil no WhatsApp

Em uma mensagem divulgada na tarde desta quinta-feira, após a escolha do novo sumo pontífice, a CNBB disse esperar que Leão XIV mantenha o caminho de abertura da igreja, seguindo o legado do papa Francisco. Na avaliação da CNBB, o novo papa vai atuar na busca da paz, orientando a doutrina da igreja para o social, em especial os mais pobres. 

Escuta e pacificação 

Ao falar sobre a expectativa com o novo papa, Dom Ricardo afirmou ainda que, como cardeal, o norte-americano Robert Francis Prevost se destacou por ser uma pessoa que escuta. Segundo Dom Ricardo essa capacidade vai ser um ponto de destaque do novo papa, especialmente nas relações diplomáticas.

“É um homem que escuta, que está atento ao que se diz. Tenho certeza que isso vai ser fundamental na conversa com os grandes governadores, com os que estão a frente dos países em crise. A igreja fortalecendo pontes, mas não por ele ser norte-americano, mas porque os papas estão com a missão de sempre buscar a paz”, opinou.

Ao ser questionado como se dará a relação do papa, um norte americano, com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, Dom Ricardo reiterou que o novo pontífice deve buscar a pacificação.

“Os papas são grandes pacificadores que tem como ponto fundamental ajudar também os governantes a buscarem caminhos de paz. Como ele vai fazer, de que maneira ele vai fazer, cabe ao Santo Padre decidir esses caminhos e vamos conhecer ao longo do tempo. Mas, com certeza, ele já deu a chave de leitura quando iniciou falando da paz. É um pacificador, alguém que vai buscar esse diálogo, alguém que vai sentar e ouvir”, apontou.

Acolhimento

Durante coletiva, ao ser questionada qual deve ser a visão do novo papa em relação a abertura da igreja a grupos invisibilizados, a exemplo da população LGBTQIA+, Dom Ricardo disse acreditar na manutenção do processo de acolhimento.

“O fato é que a igreja vem caminhando de uma maneira bonita através do papa Francisco aos invisibilizados, excluídos, e a palavra que ele [Leão XIV] usou hoje: vulnerabilizados – aqueles que estão de lado -, abrange muitos grupos, não só LGBTQIA+, mas muitos outros que são deixados de lado”, afirmou. 

“Muito mais do que uma bandeira sobre gênero, a igreja vem caminhando para a dignidade da pessoa humana, para que todas as pessoas humanas sejam respeitadas”, concluiu.

Acusações

Dom Ricardo também foi questionado a respeito das acusações de três mulheres, em 2020, contra o então cardeal Prevost, de ter acobertado casos de abuso sexual, quando era administrador da diocese de Chiclayo, no Peru. O secretário-geral da CNBB disse que não houve acobertamento e que o processo foi levado em frente.

“Importante que o processo foi à frente e foi o próprio Prevost, que à época levou a Roma para que fosse investigado até as últimas consequências. Portanto, ele não tem nada que possa dizer que ele esteve omisso, pelo contrário, foi ele quem trouxe o processo para que fosse bem investigado e é isso que desejamos de todos os processos, que sejam investigados no nível mais alto”, respondeu Dom Ricardo observando que o processo ainda está em andamento no Vaticano.

Brasil

Prevost esteve no Brasil duas vezes, como padre geral dos agostinianos, nos anos de 2012 e 2013, como padre geral dos agostinianos, nas cidades de Guarulhos, em São Paulo, e na capital mineira, Belo Horizonte.

Dom Ricardo revelou que o então cardeal Prevost, de 69 anos, estava com passagem marcada para o Brasil. Ele participaria da 62ª Assembleia Ordinária da CNBB, prevista para acontecer no período de 30 de abril a 09 de maio. O evento foi cancelado em razão da morte do papa Francisco.

“Normalmente temos um retiro espiritual durante os dez dias que os bispos ficam em Aparecida [local da assembleia] e este ano, em fevereiro, a presidência da CNBB, fez esse convite e ele aceitou de muito bom grado”, relatou Dom Ricardo. “Ele é um papo jovem, tem saúde e tenho certeza que agora convites não faltarão para ele visitar o Brasil”, disse.

Fonte

Continue Lendo

Outras

Famílias criam tribunal popular para julgar Crimes de Maio

Publicado

em

© Olívia Soulaba/Movimento Mães de Maio

Familiares, movimentos sociais, juristas e pesquisadores lançaram nesta quarta-feira (8), na capital paulista, um Tribunal Popular, para julgar de forma simbólica o Estado brasileiro pelos os crimes cometidos em maio de 2006, conhecidos como Crimes de Maio.

O tribunal deve se estender até maio do próximo ano, quando o episódio completará 20 anos.

Os Crimes de Maio provocaram 564 mortes durante confrontos entre agentes do Estado e integrantes do Primeiro Comando da Capital (PCC), entre os dias 12 e 21 de maio de 2006 no estado de São Paulo. Grande parte das mortes ocorreu com indícios de execução e praticada por policiais.

Segundo o relatório Análise dos Impactos dos Ataques do PCC em São Paulo em maio de 2006, divulgado pelo Laboratório de Análises da Violência da Universidade Federal do Rio de Janeiro três anos após o massacre, 505 dos mortos eram civis e apenas 59, agentes públicos.

A cada morte de um agente público, 8,6 civis morreram em represália. O estudo apontou ainda suspeita da participação de policiais em 122 execuções.

“Precisamos, como população organizada, colocar o Estado brasileiro no banco dos réus. O Estado brasileiro precisa ser julgado pela população que paga seus impostos e não tem uma devolutiva em cima de toda essa barbárie que o Estado propõe na favela e na periferia, principalmente com meninos pretos”, disse Débora Maria da Silva , mãe de Edson Rogério Silva dos Santos, morto durante os eventos dos Crimes de Maio.

Débora da Silva (foto) é uma das fundadoras do movimento independente Mães de Maio, que reúne mães e parentes das vítimas, e também pesquisadora do Centro de Antropologia e Arqueologia Forense da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp). 

Desde a chacina, as mães e famílias buscam por Justiça.

“Após quase 20 anos, a gente ainda procura por essa justiça. Vimos mães e pais morrerem esperando por essa justiça. São duas décadas de luta, mas ainda estamos aqui”, disse Débora. “Precisamos tirar as vendas da Justiça para que ela possa nos enxergar”, acrescentou.

Para a escritora e coordenadora de Projetos Estratégicos da Iniciativa Negra, Juliana Borges, a ausência de responsabilização pelos Crimes de Maio “expõe a lógica seletiva e racista do sistema de Justiça criminal brasileiro, que trata vidas negras e periféricas como descartáveis”.

“A falta de resposta institucional efetiva a essas chacinas aprofunda o trauma das famílias, nega o direito à memória e à verdade, e reforça um ciclo de violência estatal contínua. Denunciamos que a impunidade nesses casos não é uma falha, mas uma política, que comunica a determinados corpos sociais, sobretudo os negros e pobres, que suas vidas não importam, que o luto coletivo pode ser silenciado, e que o Estado pode seguir matando sem ser responsabilizado”, afirmou.

Em entrevista à Agência Brasil, Juliana Borges disse que a criação do Tribunal Popular funcionará como “um grito de denúncia”, mas também para não permitir que os crimes caíam no esquecimento.

“Não é uma tentativa de substituir o Judiciário, mas de tensioná-lo. É um espaço construído por movimentos sociais, famílias de vítimas e organizações comprometidas com os direitos humanos, que reconhecem a dor coletiva, constroem memória e denunciam as estruturas que sustentam a violência de Estado”.

Segundo a coordenadora, o tribunal será um ato político e pedagógico e também como um exercício de justiça comunitária e restaurativa, quando a “acusação” será feita por pessoas comprometidas com a justiça social” e o Estado será simbolicamente colocado como réu “por sua omissão, conivência ou ação direta na produção da letalidade policial”. O veredito será uma resposta da manifestação popular. 

19 anos dos Crimes de Maio

O Tribunal Popular marca os 19 anos dos Crimes de Maio, lançado durante o Seminário internacional Violência de Estado nos Crimes de Maio – Direito à memória, justiça, reparação e não repetição, promovido pela Conectas, pela Iniciativa Negra por uma Nova Política de Drogas e pela Anistia Internacional.

Também faz parte dessas ações o Projeto EnfrentAção – Pesquisa e Intervenção Multiprofissional, que fará a escuta de mães e familiares de vítimas da violência do Estado e garantir o acesso à justiça, à memória e à reparação simbólica e social. A ação envolve escuta qualificada, apoio multiprofissional e produção de conhecimento a partir da vivência de até 150 mulheres em cinco estados: São Paulo, Rio de Janeiro, Minas Gerais, Bahia e Ceará. O projeto é uma parceria entre a Unifesp, o movimento Mães de Maio e o Ministério da Justiça e Segurança Pública.

Outro evento programado é um ato público de memória e resistência, que será realizado no dia 13 de maio na cidade de Santos, no litoral paulista.

Crimes de Maio

No dia 12 de maio de 2006, véspera do final de semana do Dia das Mães, dezenas de rebeliões tiveram início nos presídios de São Paulo. Um dia antes, a Secretaria de Administração Penitenciária havia decidido transferir 765 presos para a penitenciária 2 de Presidente Venceslau, de segurança máxima no interior paulista.

Entre os presos que seriam transferidos estava Marco Willians Herbas Camacho, o Marcola, considerado líder da organização criminosa PCC.

Rebeliões ocorreram em 74 penitenciárias estaduais, articuladas pelo PCC em represália às transferências. Na madrugada de sexta-feira, os ataques contra os agentes de segurança deixaram de ocorrer apenas nos presídios e passaram a ter como alvo viaturas, delegacias de polícia, cadeias e prédios públicos. Agentes penitenciários e policiais eram os principais alvos dos ataques em todo o estado.

Em resposta aos ataques do PCC, agentes do Estado e grupos de extermínio saíram as ruas. Toques de recolher foram dados – ou boatos sobre toques de recolher se espalharam – e a população de São Paulo escondeu-se em casa, com medo de sair às ruas. Supermercados, bares, serviços, escolas, universidades e comércio tiveram que fechar mais cedo. Ônibus pararam de circular, principalmente nas periferias da cidade.

Com isso, as ruas da maior cidade brasileira ficaram desertas. O resultado dessa onda de ataques ficou conhecida como Crimes de Maio. No total, 564 pessoas morreram e 110 ficaram feridas.

Fonte

Continue Lendo

Outras

Ninguém acerta a Mega-Sena e prêmio acumula em R$ 45 milhões

Publicado

em

© Marcello Casal JrAgência Brasil

Nenhum apostador acertou as seis dezenas do concurso 2.860 da Mega-Sena, realizado nesta quinta-feira (8). O prêmio acumulou e está estimado em R$ 45 milhões para o próximo sorteio.

Os números sorteados foram: 02 – 05 – 17 – 24 – 38 – 57

  • 119 apostas acertaram cinco dezenas e irão receber R$ 25.909,13 cada
  • 6.632 apostas acertaram quatro dezenas e irão receber R$ 664,13 cada

>> Siga o canal da Agência Brasil no WhatsApp

Apostas

Para o próximo concurso, as apostas podem ser feitas até as 19h (horário de Brasília) de sábado (10), em qualquer lotérica do país ou pela internet, no site ou aplicativo da Caixa.

 

Fonte

Continue Lendo