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Castro defende no STF operação que deixou mais de 120 mortos no Rio

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© Joédson Alves/Agência Brasil

O governador do Rio de Janeiro, Claudio Castro, defendeu nesta segunda-feira (3) no Supremo Tribunal Federal (STF) a realização da Operação Contenção, deflagrada na semana passada para cumprir mandados de prisão contra integrantes da facção criminosa Comando Vermelho (CV) e que deixou mais de 120 mortos.

A manifestação foi enviada ao Supremo após o ministro Alexandre de Moraes, relator do processo conhecido como ADPF das Favelas, pedir ao governador esclarecimentos sobre a operação. Na manhã de hoje, Moraes e Castro se reuniram para tratar da questão. A audiência foi realizada no Rio.

Castro afirmou no documento enviado ao Supremo que os confrontos entre policiais e criminosos foram concentrados na região de mata para evitar tiroteios nas proximidades de áreas edificadas e resguardar a integridades dos moradores.

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O governador disse que a intervenção policial foi necessária diante de barricadas montadas pelos criminosos em regiões próximas a escolas e postos de saúde.

“A atuação estatal, diante de organizações criminosas de perfil narcoterrorista, constituiu exercício legítimo do poder-dever de proteção da sociedade, concretizando o princípio da legalidade e reafirmando o compromisso das forças de segurança pública com a legalidade, a transparência e a proteção dos direitos humanos, em estrita observância ao Estado Democrático de Direito e à defesa da vida”, afirmou Castro.

O ministro determinou a apresentação de 18 esclarecimentos sobre a operação. Confira as explicações do governador para cada item solicitado pelo ministro.

1. Relatório circunstanciado sobre a operação

Castro:  “durante as ações, os criminosos enfrentaram abertamente as forças do Estado, utilizando armas de uso restrito e de emprego coletivo, como fuzis. Integrantes trajando roupas camufladas avançaram por trilhas clandestinas em meio à vegetação, em táticas típicas de guerrilha urbana, com o objetivo explícito de eliminar o avanço policial e retardar a atuação das equipes. Foram erguidas barricadas e provocados incêndios em veículos e imóveis, além do lançamento de artefatos explosivos contra as forças de segurança”.

2. Prévia definição do grau de força adequado e justificativa formal para sua realização;

Castro:

“o nível de força adotado pelas equipes policiais mostrou-se compatível com as ameaças letais enfrentadas e limitou-se à dotação institucional padrão: fuzis semiautomáticos de uso policial, pistolas semiautomáticas, armas de menor letalidade quando aplicáveis e viaturas blindadas destinadas à proteção e à mobilidade tática”.

3. Número de agentes envolvidos, identificação das forças atuantes e armamentos utilizados;

Castro: “A operação contou com aproximadamente 2,5 mil policiais civis e militares, com apoio das áreas de inteligência dos próprios órgãos estaduais e de outros entes federativos, notadamente o Estado do Pará, e do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (Gaeco).

4. Número oficial de mortos, feridos e pessoas detidas;

 Castro:  

Criminosos mortos 117;  

Policiais mortos:  4;

Agentes do Estado feridos: 13;

Civis feridos: 4

Opositores feridos/presos: 2

5. Adoção de medidas para garantir a responsabilização em caso de eventuais abusos e violações de direitos, incluindo a atuação dos órgãos periciais e o uso de câmeras corporais;

Castro: “a operação foi formalmente comunicada aos órgãos competentes, com registros de início e encerramento junto ao Ministério Público do Estado e aos setores de controle institucional, em observância às diretrizes da ADPF nº 635 e às normas internas das corporações. Registra-se, ainda, o acompanhamento das Corregedoria da Polícia Civil e da Polícia Militar e do GAECO/MPRJ”.

6. Providências adotadas para assistência às vítimas e suas famílias, incluindo a presença de ambulâncias;

Castro: “foram disponibilizadas 06 ambulâncias posicionadas em áreas seguras para atendimento emergencial durante a operação, assegurando resposta rápida a demandas de socorro médico, sendo 2 CTI blindadas, 2 ambulâncias convencionais CTI e 2 ambulâncias convencionais para transporte da rede de saúde”.

7. Protocolo ou Programa de medidas de não repetição na forma da legislação vigente;

Castro: “a operação foi conduzida em observância às diretrizes da ADPF nº 635 e às normas internas das corporações, com implementação sistemática de procedimentos voltados ao cumprimento das determinações desta Suprema Corte, reafirmando o compromisso do governo do Estado com a legalidade e a proporcionalidade na área de segurança pública”.

8. Preservação do local para a realização de perícia e conservação dos vestígios do crime;

Castro: 

“a preservação do local para a realização de perícia e a conservação de vestígios enfrentaram dificuldades significativas. Tratava-se de área de mata de difícil acesso, o que comprometeu a integridade da cena. Ademais, foi amplamente noticiado que corpos foram removidos e descaracterizados por terceiros antes da atuação pericial”.

9. Comunicação imediata ao Ministério Público;

Castro: “a operação foi previamente autorizada e formalmente comunicada aos órgãos competentes, com registro das comunicações de início e encerramento junto ao Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro”.

10. Atuação da polícia técnico-científica, mediante o envio de equipe especializada ao local devidamente preservado, para realização das perícias, liberação do local e remoção de cadáveres;

Castro: “a atuação da polícia técnico-científica foi prejudicada por diversas razões, conforme detalhado no quesito nº 8. Dentre elas, vê-se a intensidade dos ataques armados e do risco contínuo à segurança das equipes. Além disso, corpos foram removidos por terceiros da área de mata”.

11. Acompanhamento pelas Corregedorias das Polícias Civil e Militar;

Castro: “a ação foi acompanhada institucionalmente pela Corregedoria-Geral das Polícias Civil e Militar e do GAECO/MPRJ”.

12. Utilização de câmeras corporais pelos agentes de segurança pública;

Castro: “os policiais civis da Coordenadoria de Recursos Especiais (Core) e todos os policiais militares envolvidos na ação estavam equipados com câmeras corporais (bodycams), assegurando transparência e rastreabilidade. Todas as câmeras em pleno funcionamento foram empregadas durante a operação. As ocorrências de falhas técnicas foram registradas e comunicadas à empresa responsável pela manutenção e suporte dos equipamentos”.

13. Utilização de câmeras nas viaturas policiais;

Castro: “considerando o cenário geográfico e operacional da área de atuação, os deslocamentos nos trechos críticos foram realizados exclusivamente por veículos blindados, desprovidos de câmeras e de sistema de gravação de imagens”.

14. Justificação e comprovação da prévia definição do grau de força adequado à operação;

Castro: “a definição e a comprovação do grau de força adequado à operação decorreram de planejamento exaustivo, lastreado em aproximadamente um ano de investigações conduzidas pelos órgãos de segurança pública. Equipes técnicas das polícias Civil e Militar reuniram-se ao longo de cerca de 60 dias para delinear a melhor a estratégia de execução”.

15. Observância das diretrizes constitucionais relativas à busca domiciliar;

Castro: “as buscas foram cumpridas por mandados nominativos e com endereços específicos, realizadas no período diurno”.

16. Presença de ambulância, com a indicação precisa do local em que o veículo permaneceu durante a operação;

Castro: “foram disponibilizadas pela Polícia Militar seis ambulâncias, posicionadas em áreas seguras para atendimento emergencial durante a operação, além de outra nas proximidades”.

17. Observância rigorosa do princípio da proporcionalidade no uso da força, em especial nos horários de entrada e saída dos estabelecimentos educacionais. Em caso negativo, solicita-se informar as razões concretas que tenham tornado necessária a realização das ações nesses períodos;

Castro: “a operação foi deflagrada em horário previamente calculado, de modo a evitar o fluxo de alunos e trabalhadores. A escolha do período considerou condições climáticas e parâmetros táticos de visibilidade, conforme o plano interinstitucional aprovado. Evitou-se a movimentação operacional nas proximidades imediatas de escolas e creches”.

18. Necessidade e justificativa, se houver, para utilização de estabelecimentos educacionais ou de saúde como base operacional das forças policiais, bem como eventual comprovação de uso desses espaços para a prática de atividades criminosas que tenham motivado o ingresso das equipes.

Castro: “não houve utilização de escolas, creches ou unidades de saúde”.

Matéria atualizada às 18h45 para acréscimo dos esclarecimentos pedidos pelo ministro e das respostas do governador.

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Moraes determina prisão de Ramagem após deputado ser visto em Miami

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© Fellipe Sampaio/STF

O ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), decretou nesta sexta-feira (21) a prisão do deputado federal Alexandre Ramagem (PL-RJ). A íntegra da decisão do ministro ainda não foi divulgada.

A medida foi determinada pelo ministro após o site PlatôBR informar, na última quarta-feira (19), que Ramagem está em Miami, nos Estados Unidos. Ele foi filmado pela equipe do site enquanto entrava em um condomínio na cidade norte-americana.

Diretor da Agência Brasileira de Inteligência (Abin) durante o governo Jair Bolsonaro, Ramagem foi condenado na ação penal da trama golpista a 16 anos de prisão e recorre em liberdade.

Durante a investigação, Ramagem foi proibido pelo ministro Alexandre de Moraes de sair do país e teve que entregar todos os passaportes nacionais e estrangeiros.

Os detalhes da suposta fuga do deputado ainda não foram divulgados oficialmente.

A Câmara dos Deputados informou ontem (20) que não foi comunicada sobre o afastamento do parlamentar do território nacional nem autorizou nenhuma missão oficial dele no exterior.

A Casa também informou que o deputado apresentou atestados médicos que abrangem os períodos entre 9 de setembro e 8 de outubro e 13 de outubro e 12 de dezembro.

Após a divulgação da notícia de que Ramagem está no exterior, deputados da bancada do PSOL pediram a prisão do ex-diretor da Abin ao Supremo.

A defesa do deputado informou que não vai se manifestar.

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Defesa de Bolsonaro pede prisão domiciliar humanitária ao STF

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© Fernando Frazão/Agência Brasil

A defesa de Jair Bolsonaro pediu nesta sexta-feira (21) ao ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), a concessão de prisão domiciliar humanitária ao ex-presidente Jair Bolsonaro.

Segundo os advogados, Bolsonaro tem doenças permanentes, que demandam “acompanhamento médico intenso” e, por esse motivo, o ex-presidente deve continuar em prisão domiciliar.

O pedido da defesa pretende evitar que Bolsonaro seja levado para o presídio da Papuda, em Brasília.

Condenado a 27 anos e três meses de prisão na ação penal do Núcleo 1 da trama golpista, Bolsonaro e os demais réus podem ter as penas executadas nas próximas semanas.

Na semana passada, a Primeira Turma da Corte rejeitou os chamados embargos de declaração do ex-presidente e de mais seis acusados para reverter as condenações e evitar a execução das penas em regime fechado.

No próximo domingo (23), termina o prazo para a apresentação dos últimos recursos pelas defesas. Se os recursos forem rejeitados, as prisões serão executadas.

>> Acompanhe a cobertura completa da EBC na COP30 
 

Riscos

De acordo com a defesa, a ida de Bolsonaro para o presídio terá “graves consequências” e representa risco à vida do ex-presidente.

Os advogados apresentaram exames e disseram que Bolsonaro apresenta saúde debilitada e quadro diário de soluço gastroesofágico, falta de ar e faz uso de medicamentos com ação no sistema nervoso central.

Os problemas de saúde são decorrentes da facada desferida contra Bolsonaro na campanha eleitoral de 2018, segundo a defesa. 

“São circunstâncias que, como se sabe, mostram-se absolutamente incompatíveis com o ambiente prisional comum”, completaram os advogados. 

Não há prazo para Alexandre de Moraes decidir sobre o pedido de prisão domiciliar.

 

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Sociedade em Conta de Participação: A Fraude Imobiliária que Neutraliza o Consumidor

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A utilização da Sociedade em Conta de Participação (SCP) como forma de atrair consumidores para empreendimentos imobiliários tem se consolidado como estratégia voltada a aparentar sofisticação e afastar o regime protetivo do Código de Defesa do Consumidor (CDC). O problema é estrutural: embora o instrumento seja chamado de “societário”, seu conteúdo reproduz todos os elementos de uma típica promessa de compra e venda. Promete-se unidade futura, prazo de entrega, fruição econômica e retorno patrimonial. A forma é de sociedade; a substância é de aquisição imobiliária.

A SCP, prevista nos arts. 991 a 996 do Código Civil, pressupõe atividade desenvolvida exclusivamente pelo sócio ostensivo, com ocultação do sócio participante perante terceiros. Contudo, no mercado imobiliário, o consumidor não participa de gestão, não assume risco empresarial nem exerce qualquer ingerência na condução do negócio. Muitas das vezes ele apenas paga preço, aguarda obra e espera receber a unidade. É exatamente esse descompasso entre aparência e realidade que transforma a SCP em instrumento de blindagem artificial, em grande parte dos casos.

O CDC, como norma de ordem pública (art. 1º), impede que o fornecedor afaste sua incidência por meio de rótulos. Nos termos dos arts. 2º, 3º e 6º, sempre que há vulnerabilidade informacional, padronização contratual e destinação econômica não empresarial, nasce a relação de consumo. E quando o negócio gira em torno da aquisição de imóvel futuro, não há espaço para afastar direitos como a revisão de cláusulas abusivas, o direito ao distrato e a restituição proporcional dos valores pagos.

A boa-fé objetiva, prevista no art. 422 do Código Civil, funciona como mecanismo de contenção dessas distorções. Ela impõe deveres laterais de informação, cooperação e transparência, que são violados quando a incorporadora estrutura uma compra e venda em formato societário apenas para reduzir o leque de direitos do adquirente. Quando a forma é utilizada para esvaziar direitos, surge também o abuso de direito (art. 187 do CC), especialmente quando o fornecedor tenta se esquivar de riscos que lhe são próprios.

O consumidor, vulnerável, acredita estar submisso às regras da Sociedade em Conta de Participação, contudo, mesmo tendo assinado o documento, continua sendo protegido pelo Código de Defesa do Consumidor. Trata-se de comportamento absolutamente contrário à cooperação e à lealdade que se espera em uma relação negocial de confiança.

O depósito de confiança é decisivo para compreender por que contratos de SCP usados como venda imobiliária disfarçada geram tutela jurídica no momento do distrato. Quando a incorporadora apresenta “quotas de participação” acompanhadas de plantas, cronogramas, material publicitário, simulações de retorno e promessa de entrega futura, ela cria no consumidor uma expectativa séria de aquisição. Esse cenário não nasce de percepções subjetivas, mas da própria conduta profissional da empresa, que estrutura o negócio como compra e venda, embora o rotule como sociedade.

Essa dinâmica evidencia que o consumidor deposita confiança porque o fornecedor age como verdadeiro vendedor de unidade imobiliária, construindo a aparência típica de um empreendimento sujeito ao CDC e à Lei dos Distratos. Assim, quando o negócio se frustra ou deixa de cumprir sua finalidade, o adquirente tem direito ao distrato nas mesmas condições aplicáveis a contratos de compra e venda, inclusive com restituição integral nos casos de culpa da incorporadora.

O dever de informação, previsto nos arts. 6º, III, e 31 do CDC, reforça ainda mais a impossibilidade de a incorporadora utilizar a SCP como escudo para restringir distrato. Em empreendimentos imobiliários, o fornecedor deve esclarecer de forma clara e ostensiva a natureza do negócio, seus riscos, sua estrutura jurídica e as consequências práticas da contratação.

Quando a empresa apresenta a SCP como “investimento” ou “participação societária”, mas, na realidade, vende unidades futuras com preço certo, finalidade econômica típica e promessa de entrega, viola frontalmente esse dever. A omissão ou apresentação parcial da informação não apenas compromete a formação válida do consentimento, como também impede o consumidor de avaliar corretamente seus direitos em caso de rescisão. Nesses cenários, o descumprimento do dever de informação reforça o direito ao distrato com restituição integral, pois a má informação do fornecedor contamina a própria base do negócio.

Mesmo que se admitisse — apenas por argumentação — que a Sociedade em Conta de Participação tenha sido realmente constituída como sociedade, com atuação típica do sócio ostensivo e participação nos resultados, ainda assim o Superior Tribunal de Justiça tem posição clara: o consumidor-investidor ocasional merece proteção integral. A Terceira Turma, sob relatoria da Ministra Nancy Andrighi, reconheceu que o CDC pode incidir sobre contratos de SCP quando houver vulnerabilidade, desproporção de forças ou utilização da estrutura societária como instrumento para afastar normas protetivas. No REsp 1.943.845/DF (DJe 31/03/2022), o Tribunal afirmou que a proteção consumerista alcança a situação em que o adquirente não atua como investidor profissional, mas sim como pessoa que confia na técnica, expertise e publicidade do fornecedor — exatamente o cenário observado nos empreendimentos imobiliários divulgados como “investimento” ou “participação” e que, na prática, funcionam como venda de unidade futura.

O ponto central do precedente é decisivo: o CDC poderá ser utilizado para amparar concretamente o investidor ocasional (figura do consumidor investidor), desde que a SCP tenha sido usada como meio de captação e que exista vulnerabilidade do participante — situação típica dos compradores de unidades imobiliárias travestidas de “quotas”. A Corte também enfatizou que, para afastar a incidência do CDC, seria necessário demonstrar que o adquirente exerce atividade de investimento de forma reiterada e profissional, o que não ocorre nos casos de pessoas físicas que aportam recursos acreditando estar adquirindo um produto imobiliário seguro. O próprio STJ reconheceu que, quando a SCP é utilizada com fim fraudulento ou como ardil para burlar a legislação consumerista, impõe-se a aplicação plena das normas protetivas, mantendo o foro do domicílio do consumidor, a possibilidade de distrato e a devolução dos valores investidos nos termos do CDC e da boa-fé objetiva.

Por isso, não é admissível que o fornecedor, após criar todo um ambiente de credibilidade técnica e comercial, invoque o rótulo societário para bloquear o distrato, limitar devolução de valores ou afastar o regime jurídico protetivo. A confiança depositada pelo consumidor torna exigível a coerência do fornecedor e impede que a SCP seja utilizada como barreira artificial para restringir direitos. Em matéria imobiliária, sobretudo em empreendimentos estruturados com características de compra e venda, a tutela do distrato se impõe porque deriva da realidade econômica do contrato — não do nome dado a ele.

Do ponto de vista normativo, a Lei dos Distratos (Lei 13.786/2018) reforça esse esquema protetivo. Em rescisões promovidas pelo comprador sem culpa da incorporadora, a devolução pode variar de até 75% a até 90% dos valores pagos, conforme o regime de afetação. Contudo, nos casos de inadimplemento do fornecedor, a restituição deve ser integral (100%), já que o consumidor não pode suportar riscos inerentes à atividade empresarial. A articulação da Lei dos Distratos com os arts. 35, 39, 51 e 53 do CDC afasta qualquer retenção quando a culpa é do fornecedor.

A jurisprudência recente tem, inclusive, explicitado essa realidade. A jurisprudência tem reconhecido que SCP utilizada como forma de simulação, sem sociedade real, deve ser interpretada como promessa de venda e compra.

Além disso, o arquivo doutrinário destaca que o inadimplemento antecipado atua como técnica de tutela do consumidor, permitindo a resolução quando a prestação “se torna inviável, inexequível ou inutilizável”, especialmente em contratos imobiliários de longa duração. Tal compreensão impede que o fornecedor utilize a SCP como escudo para postergar um desfecho inevitável. [N4]

Casos relatados pela imprensa reforçam que a utilização de SCP como “embalagem jurídica” tem produzido prejuízos reais, com consumidores que acreditam adquirir investimento sofisticado e descobrem, tardiamente, que financiaram obras paralisadas e sem governança. É prática abusiva, nos termos do art. 39, V e VIII, do CDC, especialmente quando associada à restrição artificial de direitos.

Em conclusão, a SCP utilizada como mecanismo para afastar distratos e reduzir direitos do adquirente não resiste à análise da primazia da realidade, nem ao regime conjunto do CDC, do Código Civil e da Lei dos Distratos. Se o contrato age como compra e venda, será tratado como tal. Cabe ao intérprete descortinar o rótulo, restaurar a funcionalidade econômica do contrato e assegurar ao consumidor o acesso integral aos seus direitos, incluindo restituição de valores, revisão de cláusulas e responsabilização por inadimplemento.

PAULO ROBERTO ATHIE PICCELLI

Advogado. Professor de Direito Civil e Direito do Consumidor. Mestre em Direito Civil – PUC-SP. MBA em Direito Imobiliário – FGV LAW-SP. Especialista em Gestão Patrimonial e Planejamento Sucessório – Instituto de Ensino e Pesquisa INSPER. Especialista em Direito Civil e Direito Empresarial. IBMEC. Professor no Curso Damásio Educacional (cursos preparatórios e pós-graduação). Professor no Curso Legale Educacional (preparatório e pós-graduação). Professor no Curso PIC (concursos para carreiras policiais). Professor no Curso Prova da Ordem. Professor Convidado na ESA-SP. Professor convidado na Pós-Graduação da FAAP-SP. Presidente da Comissão de Direito Imobiliário da OAB-SP, 101ª Sbs. 2019-2022.

 

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