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Jurídico e Direito

Pejotização e bitributação expõem lacunas não resolvidas pela reforma tributária

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Sysley Sampaio de Araújo

Decisão do STF reacende debate sobre contratos PJ e revela lacunas da reforma tributária e trabalhista diante da modernização do mercado

A decisão do ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), no dia 14 de abril de 2025, de suspender todos os processos judiciais que discutem a legalidade da chamada “pejotização”, reacendeu um dos debates mais sensíveis do mercado de trabalho brasileiro. A pejotização – prática em que empresas contratam trabalhadores como pessoas jurídicas (PJ) para reduzir encargos trabalhistas – tornou-se comum em setores como tecnologia, saúde, advocacia, corretagem de imóveis e logística.

Embora essa estratégia seja defendida por empregadores como um meio de flexibilizar contratações e reduzir custos, ela tem levado a um aumento expressivo de autuações fiscais e ações judiciais, devido à configuração de fraudes trabalhistas em muitos casos.

O crescimento dessa modalidade de contratação é evidente. Entre 2019 e 2024, o número de Microempreendedores Individuais (MEIs) no país quase dobrou, passando de 8,5 milhões para 15,8 milhões. Ao mesmo tempo, aumentaram também os conflitos judiciais.

Só em 2024, a Justiça do Trabalho recebeu mais de 285 mil processos relacionados ao reconhecimento de vínculo empregatício. Muitas dessas ações questionam contratos de prestação de serviço com características de emprego formal, como subordinação direta, jornada fixa e pessoalidade.

Quando reconhecida a fraude, tanto a empresa contratante quanto o trabalhador podem ser penalizados: a empresa deve arcar com encargos retroativos, enquanto o profissional, mesmo tendo pago tributos como pessoa jurídica, pode ser submetido à cobrança de contribuições como pessoa física, configurando um cenário de bitributação.

A decisão do STF de suspender esses processos, enquanto não é julgado o mérito do Tema 1389 (que trata da validade dos contratos de pejotização, da competência da Justiça do Trabalho para analisar tais casos e da responsabilidade pela prova do vínculo), tem o objetivo de estabelecer uma interpretação uniforme e reduzir o número de reclamações constitucionais.

Segundo Gilmar Mendes, entre janeiro e setembro de 2024, o STF recebeu mais de 4.400 reclamações envolvendo decisões trabalhistas, o que, em sua avaliação, transforma o Supremo em uma instância revisora e revela um descumprimento sistemático das diretrizes da Corte por parte da Justiça do Trabalho.

Por outro lado, entidades da magistratura e da advocacia trabalhista veem a decisão como uma tentativa de enfraquecer a competência da Justiça do Trabalho e desconsiderar sua capacidade técnica para julgar a realidade dos vínculos laborais. A polêmica escancara um conflito institucional que vai além da jurisprudência: envolve também visões distintas sobre o papel do Judiciário no equilíbrio entre flexibilidade contratual e proteção social.

Apesar de recente, a ampla reforma tributária aprovada em 2023 deixou esse tema em aberto. As novas regras de impostos não enfrentaram as distorções geradas pela pejotização. Ainda hoje, profissionais autônomos organizados como PJ estão sujeitos a serem reclassificados como empregados, sendo exigido deles o recolhimento de contribuições retroativas, mesmo após já terem pago tributos sob o regime empresarial. Essa situação cria insegurança jurídica e financeira para trabalhadores e empresas, além de comprometer a sustentabilidade da Previdência.

Um estudo da Fundação Getulio Vargas (FGV) estima que, desde 2017, a pejotização já causou uma perda de R$ 89 milhões para o sistema previdenciário.

Politicamente, o tema também divide opiniões. O senador Paulo Paim (PT-RS) critica a pejotização como um processo de precarização dos direitos trabalhistas e alerta para o risco de ampliação da informalidade. Já o ministro Gilmar Mendes tem defendido a flexibilização das relações de trabalho como uma adaptação necessária à nova realidade econômica, posição coerente com outras decisões suas, como a que extinguiu o regime jurídico único dos servidores públicos.

A suspensão dos processos sobre pejotização é, portanto, um marco importante, com efeitos diretos sobre o futuro do trabalho no Brasil. Ela promete trazer maior segurança jurídica no longo prazo, mas, por ora, paralisa o andamento de milhares de ações e acentua a incerteza para empresas e trabalhadores. Além disso, evidencia uma falha da reforma tributária, que não conseguiu resolver os problemas gerados pela bitributação em contratos de trabalho disfarçados.

Diante disso, o país se vê diante de um impasse: como adaptar seu sistema jurídico e tributário a uma economia em transformação acelerada, sem comprometer os direitos fundamentais dos trabalhadores? A decisão final do STF será determinante para o rumo das relações laborais no Brasil. Até lá, cabe à sociedade civil, aos juristas e aos legisladores manter o debate aberto, buscando um equilíbrio entre a liberdade de contratação e a justiça social.

Sysley Sampaio de Araújo – Advogado Tributarista. Pós em Direito Público, Mestre em Direito Tributário,MBA em Recuperação de Créditos Tributários ,Membro do grupo de estudos da jurisdição constitucional tributária do IDP e autor de livros. Titulação em Transição Digital e Ecológica pela Universidade de Coimbra/Portugal

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MP Eleitoral de Queimadas Aponta Fraude na Cota de Gênero e Pede Cassação de Vereador

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Foto divulgação
Foto divulgação

 

O Ministério Público Eleitoral (MPE) de Queimadas, no interior da Bahia, emitiu um parecer contundente reconhecendo fraude na cota de gênero nas candidaturas femininas apresentadas pelo partido Podemos nas eleições municipais de 2024. A decisão, que segue o entendimento balizador do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), pode resultar na anulação dos votos do partido e na cassação de mandatos eletivos, incluindo o do vereador Tonierley Guimarães Queiroz, conhecido como Toninho.

É importante destacar que este parecer foi emitido no âmbito de uma Ação de Impugnação de Mandato Eletivo (AIME) que tramita em segredo de justiça. O sigilo processual visa proteger as informações envolvidas, mas a relevância do tema e o potencial impacto na política local tornam o caso de grande interesse público.

No parecer, o Ministério Público Eleitoral ressalta que, uma vez caracterizada a fraude à cota de gênero, a lisura da disputa eleitoral é comprometida. A legislação eleitoral brasileira exige que cada partido ou coligação preencha um mínimo de 30% e um máximo de 70% para candidaturas de cada sexo. O objetivo é promover a participação feminina na política, combatendo a sub-representação de mulheres nos cargos eletivos.

De acordo com o MPE, a fraude identificada no Podemos em Queimadas indica que as candidaturas femininas não foram genuínas, servindo apenas para cumprir formalmente a cota, sem o real propósito de disputa eleitoral. Essa prática, conhecida como “candidaturas laranjas”, desvirtua o princípio da igualdade e da representatividade.

O desdobramento direto do reconhecimento dessa fraude é grave para o partido e para os eleitos. O Ministério Público Eleitoral requer a anulação de todos os votos recebidos pelo Podemos nas Eleições Municipais de 2024 em Queimadas. Consequentemente, em um ato reflexo, também foi solicitado a cassação dos diplomas de todos os candidatos eleitos e suplentes que se beneficiaram do esquema.

Entre os diretamente atingidos pela solicitação de cassação está o vereador Tonierley Guimarães Queiroz, popularmente conhecido como Toninho, que obteve seu mandato pelo Podemos. Caso o parecer do Ministério Público seja acatado pela Justiça Eleitoral, o vereador perderá seu cargo, e os votos do partido serão desconsiderados na totalização final, podendo alterar a composição da Câmara Municipal de Queimadas.

A decisão final sobre o caso caberá à Justiça Eleitoral, que analisará o parecer do Ministério Público e as provas apresentadas antes de proferir uma sentença. O desfecho dessa ação pode ter um impacto significativo no cenário político local e serve como um alerta para a importância da fiscalização e do cumprimento rigoroso das regras eleitorais, especialmente no que tange à promoção da igualdade de gênero na política.

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Justiça nega habeas corpus e mantém prisão de Celsinho da Vila Vintém

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© PCRJ/Divulgação

A Justiça do Rio de Janeiro negou o pedido de habeas corpus impetrado pela defesa de Celso Luiz Rodrigues, conhecido como Celsinho da Vila Vintém, apontado pela polícia como líder de uma facção criminosa em Bangu e Padre Miguel, na zona oeste da cidade. A decisão da desembargadora Adriana Ramos de Mello mantém a prisão preventiva decretada em 7 de maio deste ano.

Segundo a denúncia recebida em 5 de junho pela 2ª Vara Criminal da Regional de Jacarepaguá, Celsinho da Vila Vintém é investigado por tráfico de drogas e por organizar, com apoio de milicianos e traficantes, a tomada violenta de áreas do bairro Curicica, em Jacarepaguá, para expandir sua organização criminosa para outros pontos da cidade. A denúncia descreve uso de armas de fogo e intimidação coletiva para garantir o domínio territorial, circunstância que eleva a pena e agrava o quadro com concurso material.

A defesa pediu a revogação da prisão preventiva ou conversão em prisão domiciliar, alegando que o réu tem uma diverticulite aguda, além de ser o cuidador da esposa, em tratamento paliativo de doença metastática.

“A gravidade concreta dos fatos: tráfico reiterado e liderança de organização criminosa armada; o risco à ordem pública e à instrução; possibilidade de coagir testemunhas, aliciar comparsas ou fugir”, são entre outras razões, os argumentos da desembargadora para manter a prisão.

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Congresso defende no STF votação que suspendeu decreto do IOF

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© Marcello Casal Jr/Agência Brasil/Arquivo

A Câmara dos Deputados e o Senado defenderem nesta sexta-feira (11), no Supremo Tribunal Federal (STF), a validade das votações  que derrubaram o decreto editado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva para aumentar as alíquotas do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF).

A manifestação conjunta das casas legislativas foi protocolada nas ações em que o PSOL, o PL e a Advocacia-Geral da União (AGU) discutem o tema. 

Para a Câmara e o Senado, os parlamentares agiram de acordo com a Constituição ao entenderem que o decreto presidencial introduziu nova hipótese de incidência tributária, sem previsão legal.

“Não se trata aqui de simples alteração de alíquota , autorizada pelo art. 153, §1º, da Constituição, mas de introdução de nova hipótese de incidência tributária, sem previsão legal anterior que a ampare, configurando clara afronta ao princípio da legalidade tributária”, sustenta a manifestação.

Na semana passada, o ministro Alexandre de Moraes, relator dos processos, decidir levar o caso para conciliação e suspendeu tanto o decreto de Lula como a deliberação do Congresso que derrubou o ato do presidente. A audiência será realizada na próxima terça-feira (15).

Após a decisão de Moraes, o advogado-geral da União, Jorge Messias, afirmou que o órgão vai demonstrar ao STF que o decreto presidencial está de acordo com a Constituição.

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