Internacional
Saiba como atua o Conselho de Direitos Humanos da ONU

Rejeitado pelos Estados Unidos e por Israel, que recentemente anunciaram sua saída do órgão, o Conselho de Direitos Humanos (UNHRC) da Organização das Nações Unidas (ONU) completa este ano 19 anos de existência. O foro foi criado em 2006, para substituir a antiga Comissão de Direitos Humanos, que segundo o próprio secretário-geral da ONU na época, Kofi Annan, considerava enfraquecida.
“Ele deixou de ser uma mera comissão, como havia dezenas dentro da ONU, e passou a ser um conselho, equiparado aos outros dois grandes conselhos da ONU, o Conselho de Segurança e o Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social. Então, a própria criação do Conselho de Direitos Humanos já apontava para esse lugar de maior prestígio, de maior destaque do tema dos direitos humanos dentro da organização”, explica o cientista político Mauricio Santoro, professor do Centro de Estudos Político-Estratégicos da Marinha.
Comandado por um Alto Comissário, escolhido pelo secretário-geral das Nações Unidas, o conselho é composto por 47 países, eleitos pelos 193 membros da ONU, para mandatos de 3 anos. A cada ano, eleições renovam um terço de sua composição. O Brasil, por exemplo, foi eleito em 2023 para ficar no órgão até 2026.
Além do comissário e dos representantes dos países, o órgão conta ainda com um comitê consultivo, grupos de trabalho e especialistas designados para missões específicas.
A função do conselho é reforçar a promoção e proteção dos direitos humanos ao redor do mundo, abordar situações de violações e fazer recomendações sobre elas. Entre seus instrumentos estão as resoluções e decisões, que funcionam como a expressão da vontade da comunidade internacional sobre determinadas situações. Em 19 anos, foram publicadas mais de 1.400 resoluções sobre situações em diversos países.
“A adoção de uma resolução envia um sinal político forte que pode incitar governos a agir de forma a remediar essas situações”, informa o site do próprio órgão.
Segundo Santoro, as resoluções têm um impacto que extrapola o sinal político ou um simples “constrangimento” para alguns países, como aqueles que lidam com tratados internacionais de direitos humanos como instrumentos legais superiores às suas próprias legislações, como é o caso do Brasil, Chile e Argentina.
“Quando você tem uma decisão da ONU, uma resolução, ou algum tipo de debate no Conselho de Direitos Humanos, com muita frequência, eles envolvem também esses compromissos jurídicos que os países assumiram, nos tratados”, destaca.
Além das resoluções, há também as comissões de investigação e de apuração de fatos, que podem ajudar em processos penais internacionais, além da Revisão Periódica Universal (UPR), que avalia periodicamente a situação de direitos humanos de todos os países-membros da ONU. Todos eles já foram avaliados pelo menos três vezes desde 2006 e, neste momento, o conselho faz sua quarta rodada da UPR.
“Ela é universal. Todos os países são examinados. Não é uma coisa que acontece só com alguns violadores. Uma vez a cada quatro ou cinco anos, esses países passam ali por uma rodada de avaliação e o Conselho dos Direitos Humanos publica um relatório com as suas análises e com as suas sugestões do que cada país pode fazer para melhorar suas condições”, explica Santoro.
EUA
Em 3 de fevereiro, o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, assinou uma Ordem Executiva que determinava que seu país “não participará” e “nem buscará eleição” para o Conselho de Direitos Humanos, do qual foi um dos 47 membros de 2022 a 2024. Além disso, os EUA não financiarão mais o conselho.
No documento, Trump justificou sua saída afirmando que o conselho “tem protegido violadores de direitos humanos ao permitir que eles usem a organização para se blindar de seu escrutínio”.
Não é a primeira vez que o presidente estadunidense oficializa a saída da organização. Em 2018, em seu primeiro governo, Trump decidiu sair do conselho enquanto seu país tinha mandato, o qual se encerraria apenas no ano seguinte.
“O presidente Trump tem uma perspectiva da inserção dos Estados Unidos no sistema internacional que é muito peculiar. Ele considera que os Estados Unidos são o país mais importante de todos e que não podem ser prejudicados em momento algum, por razão alguma, né? E todos aqueles organismos e acordos que ele considera de alguma forma lesivos aos interesses dos Estados Unidos, ele rejeita”, avalia o professor de Relações Internacionais da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (Uerj) Williams Gonçalves.
Na Ordem Executiva assinada no dia 3 de fevereiro, Trump cita que os Estados Unidos ajudaram a fundar a ONU depois da Segunda Guerra Mundial, para prevenir conflitos globais e promover a paz, mas que “algumas agências e organismos se distanciaram dessa missão e, em vez disso, agem contra os interesses dos Estados Unidos, enquanto ataca seus aliados e propaga o antissemitismo”.
A saída dos EUA do conselho ocorreu na mesma semana em que Trump sugeriu que os palestinos saíssem de Gaza e fossem realocados em outros países. Os habitantes do território palestino sofreram nos últimos 15 meses, com ataques israelenses.
“A principal questão é a questão dos palestinos. A principal denúncia que o conselho faz é o tratamento que o Estado de Israel dispensa aos palestinos. Um tratamento que chegou ao paroxismo após a investida do Hamas contra alguns membros da sociedade de Israel. Trump considera que a crítica a Israel é, de alguma forma, uma crítica aos Estados Unidos. E, de certa forma, ele tem razão, uma vez que os Estados Unidos apoiaram integralmente do início ao fim, toda a ação genocida de Israel na faixa de Gaza”, explica Gonçalves.
Israel, aliás, anunciou que seguiria o exemplo dos Estados Unidos em relação ao conselho. “Israel considera bem-vinda a decisão de Trump de não participar do Conselho de Direitos Humanos da ONU (UNHRC). Israel se junta aos Estados Unidos e não participará do UNHRC”, escreveu o chanceler israelense, Gideon Sa’ar, em suas redes sociais, complementando que o órgão “demoniza obsessivamente” seu país.
Em entrevista para a agência de notícias Reuters, a relatora especial da UNHRC para Israel e os Territórios Ocupados Palestinos, Francesca Albanese, classificou de “arrogância” a decisão dos israelenses de deixar o conselho.
A organização internacional Anistia Internacional condenou a saída dos EUA do conselho em um momento em que “palestinos em Gaza enfrentam genocídio, deslocamento forçada e negação a apoio humanitário crítico”. Em momentos como esse, segundo a entidade, a “comunidade internacional deve reforçar urgentemente, e não abandonar, mecanismos de responsabilização e justiça”.
Consequências
Segundo Mauricio Santoro, mesmo deixando de participar do conselho, os EUA continuam sujeitos ao seu escrutínio. “É um esvaziamento político não ter mais os Estados Unidos, que são a maior economia e que têm o maior peso militar”.
Há ainda a questão do corte do financiamento, que pode atrapalhar os trabalhos do conselho. “A ONU trabalha muitas vezes com orçamentos muito apertados e muito erráticos. Com muita frequência, os dirigentes de cada uma das grandes instituições da ONU, passam um ano ali de chapéu na mão, indo aos grandes doadores, pedindo ajuda, pedindo um financiamento extra para poder lidar com uma situação de crise”, explica Santoro.
Para além dos impactos diretos na representatividade e financiamento do conselho, a saída dos Estados Unidos pode ter efeitos em outros países que têm alinhamento ideológico com Trump.
“O Trump está criando uma espécie de franquia política. Têm presidentes em outras partes do planeta que se apresentam, por exemplo, como Trump latino-americano, Trump africano. Ele criou um modelo político que está encontrando muitos seguidores. Por exemplo, a gente tem visto que a Argentina tem replicado muitas dessas ações do presidente americano. Ele saiu, por exemplo, da Organização Mundial da Saúde. Será que vai sair [do Conselho de Direitos Humanos] também?”, questiona Santoro.
Além do UNHRC, os Estados Unidos também anunciaram sua saída da Organização Mundial da Saúde (OMS), o fim do financiamento à agência das Organização das Nações Unidas para os Refugiados Palestinos (UNRWA) e a reavaliação de sua participação na Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
Novas dinâmicas
Mauricio Santoro destaca que os EUA lideraram a criação das Nações Unidas e é curioso ver, neste momento, o “criador voltando-se contra a criatura”. “Isso é muito inusitado. E vamos dizer, a gente tem uma série de preocupações, porque qual é a alternativa para as organizações internacionais. Elas exercem funções muito importantes, criam um ambiente global que é mais previsível, que é mais estável, onde há mecanismos melhores de transparência, de compartilhar informações”, ressalta.
O professor Antonio Jorge Ramalho da Rocha, da Universidade de Brasília (UnB), considera lastimável que o atual governo estadunidense renegue os valores promovidos por seu país logo após a Segunda Guerra Mundial.
“Eles vão sair perdendo mais do que quaisquer outros países em relação a isso. No longo prazo, isso é a aceleração de sua decadência. Não tenho dúvida de que é um erro do ponto de vista do interesse deles. Os Estados Unidos se fundaram com base nessa convicção compartilhada, nesse valor de que os seres humanos devem ser objeto de proteção pelos Estados. Toda a estrutura política dos Estados Unidos está montada para impedir que os governantes oprimam os cidadãos, para proteger as liberdades individuais”, explica.
Segundo Rocha, o vácuo deixado pelos Estados Unidos no conselho pode ser uma chance para que outros países, como aqueles da União Europeia e do Sul Global, inclusive o Brasil, assumam um papel de liderança na defesa dos direitos humanos no planeta.
“É preciso que os países que prezam esses valores abracem o conselho, financiem suas ações. Hoje há um vácuo de liderança. É uma grande oportunidade para um país como o Brasil, que tem uma tradição de respeito, de defesa e de promoção do multilateralismo. Resta saber se tem energia, recursos e visão clara para ocupar esse espaço”, conclui o professor.
Internacional
Colômbia: Petro chama atos por consulta popular de reforma trabalhista

O presidente da Colômbia, Gustavo Petro, convocou para esta terça-feira (18) um “dia cívico” com atos por todo o país para apoiar a Consulta Popular que pretende realizar sobre a reforma trabalhista proposta pelo governo e em tramitação no Legislativo.
“Às ruas pelo simples direito de viver bem. Hoje você não vai sair para defender o Petro, hoje você vai sair para se defender”, convocou o presidente pelas redes sociais.
Com a convocação do “dia cívico”, empregados podem ser liberados do trabalho para participar dos protestos. Prefeitos de grandes cidades colombianas rejeitaram o dia cívico e afirmam que vão manter os serviços públicos funcionando.
Na semana passada, Petro anunciou que irá consultar a população sobre a reforma trabalhista proposta pelo governo depois que Comissão do Senado aprovou moção pelo arquivamento da reforma, com 8 votos dos 14 senadores do colegiado.
Nesta terça-feira, a Comissão do Senado volta a analisar o tema para confirmar, ou não, o arquivamento definitivo do projeto.
A reforma trabalhista – já aprovada pela Câmara dos Deputados da Colômbia – prevê limitar a jornada de trabalho diurna, com pagamento de horas extras para as horas trabalhadas à noite, aos sábados, domingos e feriados.
Outros temas tratados pela reforma são a regulação da licença paternidade; a melhoria da remuneração para jovens aprendizes e medidas para criar maior estabilidade laboral, priorizando os contratos por tempo indefinido e limitando os contratos temporários de emprego.
Gustavo Petro alega que o Congresso colombiano tem bloqueado o avanço das reformas sociais do governo. Apesar de conseguir aprovar uma reforma das aposentadorias, Petro tem encontrado dificuldades para avançar com as reformas trabalhista e da saúde, que também pode entrar na Consulta Popular.
Segundo Petro, a primeira pergunta da consulta é: “Você quer que o dia na Colômbia termine às 18h e que sábado e domingo sejam feriados, o que significa que haverá uma sobretaxa de pagamento por horas extras?”.
Oposição
A decisão de recorrer à Consulta Popular, medida prevista no artigo 104 da Constituição colombiana, tem gerado fortes críticas de opositores, de entidades empresariais e de setores do parlamento.
O presidente do Senado, Efrain Cepeda, do Partido Conservador, criticou a pressão contra os congressistas e acusou Petro de ser “ofensivo” contra o Parlamento.
“O Congresso continuará a tomar decisões de forma autônoma e a critério de seus membros. Apoio totalmente a postura corajosa dos membros da Sétima Comissão, que hoje tomam decisões técnicas, não políticas, em benefício de todos os colombianos”, informou o congressista em uma rede social
O presidente do Senado Cepeda disse ainda que a consulta precisa de autorização do Senado e que dificilmente haveria recursos para bancar tal iniciativa. “Se o registrador reclama que não tem recursos para as eleições atípicas em 2025, de onde sairá o dinheiro?”, completou Efrain em entrevista à Rádio Caracol.Petro acusou a Comissão do Senado de “trair os trabalhadores”.
O presidente colombiano também enfrenta a oposição dos sindicatos patronais, contrários à reforma laboral que, segundo os empresários, levaria a perda de milhares de empregos.
“Se opõem à reforma trabalhista porque eles colocam os trabalhadores em jornadas noturnas em grandes lojas de varejo e aos sábados e domingos, diferentemente de qualquer outro lugar do mundo”, afirmou Petro em resposta à Federação Nacional de Comerciantes Empresários (Fenalco).
O presidente da Fenalco, Jaime Alberto Cabal, criticou a “imposição” do dia cívico. “Convocar marchas e declarar dia cívico no mesmo dia em que se debate no Senado o projeto de reforma trabalhista é uma pressão indevida e antidemocrática”, destacou o empresário.
Prefeituras
Além disso, prefeitos de importantes cidades colombianas, como Bogotá, Cartagena e Medellin, rejeitaram a proposta de dia cívico de Petro e prometem manter os serviços públicos funcionando.
O prefeito da capital, Bogotá, Carlos F. Galán, afirmou que os 710 mil estudantes de colégios públicos da cidade terão aulas presenciais.
“Bogotá garantirá a prestação de todos seus serviços e não se somará ao dia cívico. Bogotá respeita o direito ao protesto e à manifestação pacífica. As equipes de diálogo e convivência estarão prontas para garantir os direitos, tanto de quem decide sair para as ruas, como quem decide não o fazer”, afirmou em rede social.
Internacional
Volta da guerra por Israel busca anexar Gaza e blindar Netanyahu

O projeto de anexar a Faixa de Gaza e o temor do primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, de investigações de corrupção contra ele estão por trás da decisão de retomar os bombardeios ao território palestino na madrugada desta terça-feira (18). Essa é a avaliação de analistas consultados pela Agência Brasil.
Os especialistas no conflito Israel-Palestina descartaram que o retorno dos ataques à Gaza tenha relação com alguma intransigência do Hamas para negociar a liberação dos cerca de 60 reféns que seguem nas mãos do grupo, conforme afirma a versão oficial do governo de Tel-Aviv.
O professor do departamento de sociologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) Michel Gherman analisa que, por trás da decisão de retomar a guerra, está o escândalo do Qatar Gate, investigação que indica que assessores de Netanyahu receberam dinheiro da monarquia absolutista do Qatar, que também financia o Hamas e é um dos interlocutores do acordo de cessar-fogo.
“O que está acontecendo é uma tentativa de golpe [para se manter no poder], e os bombardeios, de ontem para hoje, foram uma forma de silenciar o que está acontecendo com o escândalo do chamado Qatar Gate”, disse Gherman.
Os bombardeios mataram cerca de 400 palestinos em menos de 24 horas, sendo 100 crianças, segundo cálculos do Ministério da Saúde de Gaza, e rompem uma trégua relativa de dois meses iniciada no dia 19 de janeiro.
Gherman acrescenta que o anúncio dessa semana de demissão do chefe da agência da segurança interna de Israel Shin Bet, Ronen Bar, pode ser consequência da recusa de Bar em interromper as investigações sobre o caso Qatar Gate. Netanyahu justifica que “perdeu a confiança” no aliado.
A professora de pós-graduação em relações internacionais da PUC de Minas Gerais Rashmi Singh concorda com essa avaliação e diz que Netanyahu usa o pretexto das negociações de paz e da troca de reféns para se proteger do processo judicial por corrupção.
“Ele deveria testemunhar esta semana. Isso agora foi adiado por causa da retomada da agressão em Gaza”, comentou.
Anexar Gaza
Ao mesmo tempo, a especialista em Oriente Médio Rashmi Singh avalia que o projeto de anexar Gaza é determinante para a volta dos bombardeios.
“A retirada unilateral de Israel do cessar-fogo é totalmente esperada e resultado de suas próprias ambições. A retomada da matança de moradores de Gaza sob o pretexto de combater o terrorismo/Hamas é parte de uma estratégia de ocupação ilegal e anexação de terras em Gaza”, avaliou.
Rashmi diz que a justificativa de Israel para retomar o bombardeio à Gaza não se sustenta. “Essa é uma tática de distração, porque o acordo original do cessar-fogo não tinha essa cláusula em vigor [de liberar todos os reféns unilateralmente pelo Hamas]. Então, Israel está mudando os termos do cessar-fogo para seus próprios objetivos”, comentou.
Libertação de refém israelense pelo Hamas. Frame/Reuters TV/Proibida reprodução
A primeira fase do acordo de cessar-fogo previa a devolução de 25 reféns vivos, dos restos mortais de outros oito mortos, além da liberação de 2 mil prisioneiros palestinos, muitos dos quais foram presos novamente por Israel. Enquanto a segunda fase não fosse negociada, deveriam prevalecer os termos da primeira fase, com manutenção do cessar-fogo. O governo de Tel-Aviv também violou o acordo ao bloquear a entrada de ajuda humanitária no enclave palestino desde o dia 1º de março.
Para a especialista da PUC de Minas, a anexação dos territórios palestinos segue também na Cisjordânia, onde Israel expulsou nos últimos meses mais de 40 mil pessoas de suas residências.
“Isso é tudo ilegal, em violação ao direito internacional e, no caso da linguagem normalizada de limpeza étnica como ‘realocação’, até mesmo um crime de guerra”, acrescentou Singh.
Israel tem defendido o projeto para Gaza do presidente dos Estados Unidos (EUA), Donald Trump, com o deslocamento da população para países vizinhos, o que vem sendo rejeitado pelos Estados árabes e pelas lideranças palestinas.
Primeiro-ministro de Israel, Benjamin Netanyahu, e presidente dos Estados Unidos, Donald Trump. REUTERS/Leah Millis/Proibida reprodução
Acordo enfraquece Netanyahu
O professor da UFRJ Michel Gherman acrescenta que os termos do acordo, em especial com a implementação da segunda fase, colocaria o gabinete de Netanyahu em risco de dissolução por falta de apoio dos setores mais radicais.
“A segunda fase do acordo, politicamente, transforma realmente o Hamas em vitorioso. Liberaria referências importantes da política palestina, como Marwan Barghouti, e colocaria Israel numa situação vergonhosa de não ter conseguido seus objetivos de guerra, a não ser a liberação dos reféns que sobreviveram”, comentou.
Gherman sustenta que, para um governo de extrema-direita como o de Netanyahu, essa segunda fase seria impossível de implementar. “É uma fase de acordo com um grupo que Israel supostamente indicaria que era preciso destruir”, completou.
Internacional
Israel ameaça civis de Gaza com último aviso para “destruição total”

O ministro da Defesa de Israel, Israel Katz, divulgou nesta quarta-feira (19) uma mensagem em uma rede social, dirigida aos moradores civis da Faixa de Gaza, onde ameaça com a “destruição total” da região caso a população não remova o Hamas e não entregue os reféns israelenses.
“Moradores civis de Gaza, esse é o último aviso. O ataque da força aérea contra os terroristas do Hamas foi apenas o primeiro passo. O resto será muito mais difícil e vocês pagarão o preço total. A evacuação da população das zonas de batalha começará novamente em breve”, afirmou o chefe das Forças Armadas israelenses.
Em sua mensagem, Katz pede ao povo palestino de Gaza que aceite a oferta do presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que defende a remoção dos moradores do enclave para outros países, com posterior anexação do território. A solução é rejeitada pelos estados árabes e pelas lideranças palestinas. Mas o ministro da Defesa ameaça, afirmando que, caso contrário, “Israel agirá com forças que vocês ainda não conhecem”.
“Aceite a oferta do presidente dos EUA, liberte os reféns e elimine o Hamas, e outras opções se abrirão para você, incluindo ir para outros lugares do mundo, para quem quiser. A alternativa é destruição total”, finaliza a mensagem Katz.
Na terça-feira (18), Israel retomou os bombardeios contra Gaza após quase 2 meses de um cessar-fogo relativo. O Ministério da Saúde local calculou que os recentes bombardeios mataram mais de 400 pessoas, incluindo mais de 100 crianças.
O governo do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu alega que o Hamas não tem aceitado negociar a entrega dos 59 reféns que permanecem sob controle do grupo islâmico palestino, além de supostamente planejar novos ataques contra o país.
Hamas
O Hamas nega que tenha rejeitado as negociações para liberação dos reféns e afirma que o governo de Tel-Aviv usa pretextos falsos para justificar o retorno à guerra.
“A ocupação [de Israel] está tentando enganar a opinião pública e criar falsas justificativas para encobrir sua decisão premeditada de retomar seu genocídio contra civis desarmados; desconsiderando completamente seus compromissos sob o acordo de cessar-fogo”, denuncia o grupo, em nota.
O Hamas ainda responsabilizou diretamente os EUA pelo retorno dos bombardeios.
“Com seu apoio político e militar ilimitado à ocupação, Washington tem total responsabilidade pelos massacres e assassinatos de mulheres e crianças em Gaza”, afirmou o grupo.
Representantes da Casa Branca confirmaram que foram informados por Israel que retomariam os bombardeios em Gaza, segundo a Reuters.
Entenda
Especialistas no conflito do Oriente Médio consultados pela Agência Brasil avaliam que a volta da guerra por Israel busca consolidar o plano para anexar o território da Faixa de Gaza, além de servir para blindar o primeiro-ministro Benjamin Netanyahu, acusado de corrupção e sob risco de dissolução do seu gabinete com a perda de apoio dos setores mais radicais do parlamento.
“A retirada unilateral de Israel do cessar-fogo é totalmente esperada e resultado de suas próprias ambições. A retomada da matança de moradores de Gaza sob o pretexto de combater o terrorismo/Hamas é parte de uma estratégia de ocupação ilegal e anexação de terras em Gaza”, avaliou a professora de pós-graduação em Relações Internacionais da PUC de Minas Gerais Rashmi Singh.